Inocente
como eu, você também acreditou na previsão do tempo quando disse que faria
frio. Agora sei que você daria uma péssima cartomante: o frio chegou com três
dias de atraso e estragou meu modelito. Quiromante de quinta, não me contou
tudo que leu, eu sei. Leu entretanto, outras linhas incertas, percorridas em
mim: na palma das minhas mãos, na conversa adentrando o adiantado da hora, na
pouca distância entre nossos sorrisos. Entre nós.
Sim, a
felicidade é fortuita. Espoca em pequenos gestos, em grandes viagens, numa
música, num sabor, numa tarde fria de cinza-fosco e bons acontecimentos. Ela
espia por entre as frestas do que somos, do que sentimos; ela espreita da
somatória insana das nossas decisões tão precisas quanto uma roleta-russa. Felicidade
não cabe: aprende-se a dar espaço a ela, para que apareça, para que germine, para
que se faça. É assim ou então o medo. O descompasso. O desperdício dos dias,
dos risos, do que somos e do que, tão logo, não mais seremos. Felicidade
descende de um ato de coragem, de um arroubo, de uma quase insanidade do ponto
de vista de quem se fia em probabilidades.
Mas ela não
está aqui para provar nada. Não está aqui para isso. Não está nem aí. A
felicidade verte mesmo é da nossa falta de cuidado.
O frio que
você previu se fez hoje. E pelo jeito fica um tempo. Já a felicidade não sei
até quando. Sei que por enquanto, neste canto, permanece.